junho 04, 2010

Old texts 2

Mais um dos meus textos antigos. Um "desafio", como o anterior. Desta vez, era pra descrever uma cena de ação climática, se eu não me engano.

Lendo novamente eu acho que ficou poética demais (ou uma tentativa forçada de ser poético, não sei), mas aqui vai o texto, sem alterações:


HORA DE MORRER.
Quando Zack olhou para baixo, percebeu que ia morrer.

O tiro explodiu parte de suas tripas, de tal forma que elas nem saiam pelo buraco de bala. Era só um grande rasgo negro que pulsava, como a boca aberta de uma fera. E ela babava sangue em quantidade absurda.

Ainda com a cabeça baixa, viu a arma em sua mão direita. Um colt .45 preto, com o cabo de marfim. Sua pistola da sorte. Quase nunca errara um tiro com ela, e quase sempre um tiro dava conta do recado, quando o alvo era feito de carne e ossos. O cabo de marfim era uma adaptação que ele mesmo tinha feito - um lembrete da graça e sutileza, mesmo numa ferramenta de morte. Cowboys gostavam de furar seus alvos como queijo suíço, gastando 300 dólares em cartuchos para cada cadáver. Zack gostava das coisas limpas e do 100% de acerto. Uma bala, uma morte. O cabo servia para lhe lembrar disso.

Colocou sua mão esquerda sobre o ferimento, numa tentativa reflexiva de parar o sangramento. Quando sentiu que mergulhava a mão numa piscina, tamanha a quantidade de sangue, riu pelo esforço inútil. Mas ainda assim, a mão repousava no ventre.

Ainda olhando para baixo, se viu por inteiro. As botas de combate, a calça preta, e o casaco 7/8, tudo tinha um propósito e um porquê. Zack era meticuloso. É uma das consequencias do serviço militar: achar a funcionalidade de tudo. E além disso, ele era vaidoso. Gostava de mesclar cores de roupas e tecidos. Por isso que, embora usasse um coturno, esse era discreto e de um marrom escuro, que combinavam com a calça e a camiseta. Zack gostava de se sentir bonito, mesmo carregando à morte. Ninguém gostava de ser morto por um errante, um qualquer. Já com um assassino imponente, o alvo não luta; resigna-se, achando que o anjo ceifador chegou, e não a nada a fazer. E devido a experiência de Zack, realmente não havia.

Achou apropriado estar no topo de um prédio, numa chuva torrencial. Hoje em dia, com tanto asfalto e vidro, quase não se vê o ceu noturno, e pode se passar um ano sem tomar chuva. E Zack sempre quisera morrer debaixo de uma chuva. Achava poético. Tinha medo de se lembrar das coisas ruins que tinha feito e de chorar... mas com chuva, ninguém veria suas lágrimas. Mal ele sabia o quanto estava enganado, pois o que o acometia era uma placidez engraçada. Tinha vontade de rir baixo e esperar a morte. Mas sabia que não havia tempo para esperar, pois Liz ainda precisava dele.

Quando um trovão fez-se ouvido, tirou Zack do seu transe. E na mesma velocidade do barulho, lembrou-se do que fazia lá. Um contrato. Matar um homem. Uma cilada - o homem já o esperava. Havia sequestrado uma mulher chamada Liz e alguém mandou Zack achá-la. Mas outra pessoa que não se importava com Liz achou que era a oportunidade certa de se livrar de Zack. Bastou avisar o assassino serial de que um mercenário estava a caminho. Antes, ele teria apenas uma faca, e não a metralhadora qual acertou Zack. Antes, seria um alvo fácil.
Agora era quem o matava.


Zack olhou pelo telhado e viu que tinha apenas uma opção. O assassino se escondera atrás de um transformador de energia, e essa era a única barricada no telhado todo. A perseguição acabara. Quando Zack chegou ao topo, foi recepcionado por uma rajada certeira. Atirou de volta, mas a dor e o impacto lhe fizeram errar os disparos. Caiu no chão, mas rapidamente levantou-se, apenas para fazer as constatações acima. E assim encontrava-se na situação atual, molhado e morrendo, enquanto um maniaco louco escondia-se com sua vitima num telhado. Podia ouvir Liz gritar, mesmo amordaçada. Se falhasse, ela também morreria, e pelo que conhecia do seu alvo, de uma maneira muito mais horrivel do que ele.

Na hora da morte, tomado pela ciência de que aqueles eram os seus últimos segundos nesse mundo, Zack correu. Seus passos ecoavam pelo telhado, mas ele não se importava. Era cumprir o contrato ou morrer, e ele ainda não tinha feito nenhum dos dois.

O maníaco irrompeu gritando do lado esquerdo do transformador, atirando à esmo na direcão dos passos - na direção de Zack. Enquanto as balas zuniam por ele, Zack mirou, frio. Outros três tiros atingiram-no, dois no tronco e um no joelho esquerdo. Zack nem mesmo parou de correr.

Simultaneo ao barulho que denunciava que a metralhadora estava sem balas, Zack atirou. O tiro, agora a queima roupa, acertou dentro da boca escancarada do alvo. O último ato do maniaco foi gritar, e o tiro roubou-lhe a voz para sempre. A bala da .45 levou o que um dia foi sua garganta para 30 andares abaixo, e ele na mesma hora vidrou os olhos e caiu, morto.

Zack então olhou para o lado e viu Liz. Mesmo tendo visto suas fotos, ela era diferente de como ele imaginava, linda e frágil ao mesmo tempo. Ela estava assustada.
Dando às costas ao tranformador, deixou-se cair ao lado dela, e a desamarrou. Ela ainda estava quieta, num choque trêmulo. Ele riu e acendeu um cigarro, marca marlboro. Apontando sua arma, disse para ela:

- Sabe, eu nunca erro. E nunca deixei de cumprir um prazo. Você está livre. Está salva. Aproveite o tempo que lhe resta e fique longe de problemas, ouviu?

Deu uma tragada no cigarro, o único habito ruim que herdou do quartel. Soltou a fumaça e continuou.

- Sempre me disseram que o cigarro me mataria, mas eu nunca acreditei. Quão irônico.

Liz então chorou, um choro limpo de alegria e felicidade. Estava livre, realmente. E abraçou Zack com força, cabeça ao peito dele. A chuva incessante lavava o sangue que escorria junto com as lágrimas de Liz, fazendo-a se sentir limpa e protegida. Olhou para o colt com o cabo de marfim e não pode deixar de pensar que aquilo era a sintese do homem que abraçava: uma arma linda.

Quando o cigarro caiu e se apagou no sangue de Zack, foi que ela percebeu que ele não mais respirava. "Obrigado", foi tudo o que ela conseguiu dizer para ele enquanto chorava. Para ele, ouvir isso enquanto morria foi a última reflexão. "Que engraçado", pensou. "Um assassino profissional que matou um serial killer para salvar uma vida. Quanta morte, quanto sangue nós dois derrubamos. E agora, nós dois morremos, e na primeira vez que matei alguém por uma causa boa."

"No fim, não é ruim morrer logo... Afinal, eu me aposentaria de qualquer jeito depois dessa."

3 comentários:

Mamangava disse...

Curti esse também. Não sei por quê, mas eu imaginei a cena em preto e branco, tipo Sin City, manja?

Massa!

Gustavo disse...

parabens, cliquei no google do nada quando procurava material sobre um tema para um trabalho da faculdade (direito.) quando caí no seu texto de como sobreviver a prisão ..

Resultado

1 li seu blog quase todo,
2 adicionei nos meus favoritos
3 peguei prova final na matéria pq nao fiz o trabalho

Anônimo disse...

Bão...meio cliché, mas bão...

G.