Memórias
(Esse foi um texto que eu fiz em convite do Leo Pinheiro, um amigo meu. Você pode achá-lo aí do lado nos links, no Balcão da Padaria. Achei que agora seria uma boa hora pra postá-lo aqui, já que a exclusividade era de um dos blogs dele, mas agora já faz um tempo, e o assunto não morreu.)
"Gostaria de começar esse texto com um pedido de desculpas. Na verdade, isto está atrasado uma semana, porque eu me esqueci de prepará-lo para domingo passado, por mais veementemente que meu amigo Leo me avisasse; e por isso, as desculpas tardias vem antes do meu agradecimento pelo pedido de, de fato, escrever algo para postagem num espaço que não é de minha autoria. Pode parecer coisa pequena, mas ter outros pedindo que você faça alguma coisa para que eles possam mostrar de alguma forma me remete aos tempos de colégio e aos trabalhos nota alta que todo mundo quer pôr o nome e me deixa orgulhoso.
Mas eu estou me gabando. Nada muda o atraso e a mancada.
E isso me fez ficar pensando: o que gera o atraso? O esquecimento? Pois me parece óbvio que as duas coisas estão atreladas: se você se atrasou é porque esqueceu de algo, na maioria das vezes. A alternativa pro esquecimento é a falta de importância; se você não tá nem aí para alguma coisa, a tendência de você esquecê-la é grande, e daí é um pulo pro atraso. Então, parece um credo Jedi: a baixa importância leva ao esquecimento, o esquecimento leva ao atraso, e o atraso leva ao lado negro da Força.
Filosofagens à parte, eu fiquei bem puto com essa constatação. Poxa, eu fiquei bem honrado com o convite, logo não teria como eu ter dado pouca atenção à esse texto. Fiquei imaginando então que talvez fosse um stress momentâneo, uma falha cognitiva, sei lá, qualquer coisa que me tenha impedido de lembrar do compromisso, mas parece que eu esqueci o motivo disso também. Talvez eu precise de fósforo em minha dieta. Mas fósforo não é tóxico? Não me lembro.
Analisando mais, percebi que não me lembro de mais coisas sobre mim do que realmente me lembro delas. Por exemplo, do meu primeiro dia de vida até uns quatro anos, talvez, não me lembro de absolutamente nada. Minha infância é revista por flashes de momentos que eu me lembro, cercada de grande lacunas vazias de que não me lembro. Qual era o prémio da Porta dos Desesperados do dia 21 de março de 1989? Não me recordo.
E posso listar coisas assim eternamente: Quem era o técnico do time do Guarani na temporada 89? Não sei, mas o Mário Tilico era o ponta do São Paulo. Quem era o ministro da Agricultura do governo Sarney? Não me lembro. Qual era o sobrenome da Araceli, uma menina legal que estudava comigo? Não me recordo. O Rambo do desenho animado tinha um amigo que era um ninja branco, que eu não me lembro do nome. Eu não me lembro de todas as vezes que eu brinquei com o meu cachorro, e nem todas as meninas que eu admirei no colégio. Também não lembro qual foi o primeiro filme que eu vi no cinema, assim como não me recordo qual foi o primeiro jogo de videogame que eu testei. E nem o primeiro jogo que eu vi do estádio. E não são só as primeiras coisas... eu também não lembro do que eu fiz no meu aniversário de 13 anos, nem quando eu descobri que era melhor correr atrás das meninas do colégio, do que fugir delas no recreio. Também não sei quando eu vi a luz e percebi que puxar o cabelo e fazer coisas assim é uma forma infantil de chamar a atenção.
Assim sendo, me esquecendo de mais coisas da vida do que lembrando delas, era de se esperar que eu esquecesse a data o texto completamente. Mas é assim com você também. Pelo visto, o que vale são os momentos marcantes, e não as mesmisses que nosso cérebro apaga. Talvez ele realmente apague a rotina para poupar espaço para os momentos que valem na memória. A nossa parte então é criar mais passagens marcantes, porque pelo visto, é o que faz você pensar no passado com orgulho, e ter a sensção que realmente viveu. Talvez seja a diferença entre uma velhice amarga e uma digna.
Desse texto eu não vou esquecer, prometo."
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